Marcava 44ºC um termómetro – ao Sol, dê-se lhe o desconto – perto de Alvalade, durante a tarde de hoje. A verdade, é que já se sabia desde há uns meses que o Inferno havia caído sobre aquela zona de Lisboa, contudo, hoje fora puramente metereológico. Mas não foi este calor dantesco que afastou uma muito bem composta Associação Joaquim Xavier Pinheiro – que é como quem diz, a sala de Alvalade – de assistir ao que prometia ser um festival de chapadaria gratuíta.
Aos Shape começa a faltar palco para tanta música. E, talvez por isso, o vocalista da banda não se dê, sequer, ao trabalho, de o usar. Como seria de seu direito, afinal. A voz é feita do chão e, aquele que até temia começar por ser um início frio de matiné musical – sintam a ironia das palavras -, acabou por se tornar em mais uma prova do quão grande se está a tornar esta banda. Público a transmitir calor humano desde o início do show – tumba, outra! -, quer nos originais da banda, que, aliás, vão já sendo sabidos de cor, quer nas covers (The Machinist, Have Heart e 1992, X-Acto) tocadas pela banda. Aguarda-se com impaciência o lançamento de algum registo da banda.
Aos The Skrotes coube a díficil tarefa de conseguir dar seguimento ao concerto dos Shape. Com uma, visivelmente, menos cheia sala, os Skrotes ofereceram o que melhor o seu skate-punk- de-elevada-violência-e-rapidez possibilita. Os Skrotes têm uma onda muito característica e, com isso, um público sempre bastante fiel que – wait for it - não os deixa ficar a arder, mesmo com o calor que se fazia sentir. Da mesma maneira que a banda ofereceu aquilo que dela se espera: caos, anarquia músical e uma excelente presença em palco. Ah, e sets curtos, sem merdas. Claro.
Foram precisos oito meses para que os Reality Slap voltassem a tocar em Lisboa. Durante este interregno, a banda tem estado a gravar o novo álbum “Necks and Ropes” do qual apresentaram, em Alvalade, temas que o constituem. Músicas essas que demonstram uns Reality Slap com uma potência e poder que ainda não tinham sido vistos. Sim, ainda mais bruto que as faixas de registos anteriores. Ficou-se ainda a saber que, uma delas, contará com a participação do vocalista de Parkway Drive. E, como não poderia deixar de ser, o concerto de Reality Slap foi o verdadeiro Get Slapped Fest, ao qual não faltou gente a levar demasiado à letra esta intitulação (as melhoras a todos). Se já havia calor, os Reality Slap encarnaram o diabo e foi, definitivamente, o Inferno na Terra.
Os Devil in Me voltaram a tocar em Lisboa para encabeçar a matiné hardcore, bem típica do bairro de Alvalade – como, aliás, fizeram questão de deixar bem claro logo no início do brevíssimo concerto da banda, mas já lá vamos -, afinal, foi ali que começaram bandas como, por exemplo, os For the Glory. Os Devil in Me apresentaram, desde logo, uma surpresa: Mike Ghost no baixo, o que, porventura, deveria significar a introdução de “Claim My World”, do recente álbum da banda, “The End”, no set da mesma. Tal não chegou a acontecer. Mas vamos por partes. Os Devil in Me tinham uma sala à sua espera. Havia, até, quem tenha vindo do Alentejo para os ver – true story. E, desde o início do concerto, com “The End” e “Alive”, que praticamente toda a sala fez questão de o demonstrar. Mas o concerto dos Devil in Me estava condenado ao insucesso. Foram vários os problemas de som que a banda enfrentou, ao longo do seu set, que impossibilitou, em grande parte do tempo, ouvir sequer os instrumentos ou a voz. E, foi com apenas mais “On My Own”, “City of the Broken Dreams”, “Live Fast Die Young” e “Brothers in Arms” que a banda viu o seu concerto ser interrompido, de vez. Não, não por culpa dos já citados – e recuperáveis – problemas de som, mas por via de dois agentes policiais que obrigaram ao términus da matiné. Afinal, nenhum de nós está nisto para arranjar confusão.
Foi com este final abrutpo que, a quase cheia sala de Alvalade, se despediu de uma bastante saudável cena hardcore lisboeta, como que renascida das cinzas. Não foi o calor e o bom tempo que afastaram o público para a praia, como se poderia fazer prever. Quem sabe, não fora esse mesmo calor e bom tempo que levaram a alguns membros, bastante jovens, do público a deslocarem-se a Alvalade. Que o bom tempo continue, então.