Foi com calor, bastante calor, e um mar de gente – ou talvez devamos dizer um rio de gente, dada a proximidade com o Tejo –, que o Revolver Bar recebeu mais uma saudosa noite de hardcore. Em trejeitos de beneficiência, pelos animais, juntaram-se quatro dos melhores representantes nacionais do género.
Percebe-se que a noite é especial – mesmo que não tenhamos em conta o cariz final do evento – quando, desde o primeiro minuto, da primeira banda, há uma envolvência e uma devoção do público perante a mesma. Aos Cold Blooded caberia a díficil tarefa de abrir uma noite que teria pela frente, ainda, Steal Your Crown, Devil in Me e For the Glory. Mas, apesar da relativa juventude cronológica da banda Lisbo-Almadense, o andamento que diversas tour já lhes conferiram, permitiram que a banda tivesse o público na mão, desde logo. Duros que nem betão, os Cold Blooded basearam o seu alinhamento na demo já lançada, bem como em novas músicas, não descurando ainda a participação de elementos próximos da banda. Seguramente, um dos mais sólidos abrir de noite que poderemos ter memória.
Os Steal Your Crown subiriam ao palco para dar continuidade à noite que, acima de tudo, era para os animais. Não o público, animais mesmo. Dos que ladram e miam e assim. E, como não poderia deixar de ser, ao jogar em casa, o concerto da banda da Margem Sul ameaçou a saúde de todos os presentes. No bom sentido, está claro. Duríssimo, será pouco objectivo para descrever o que ia decorrendo frente ao palco. Um entrega e uma adesão quase total de um público que, por esta altura, já enchia quase na totalidade a sala almadense.
Não se tivesse visto o que se passara anteriormente e, à partida, seria então a vez do primeiro nome grande da noite entrar em cena. Seriam os Devil in Me. Mas, como já se percebera, por esta altura nomes grandes já pouco sentido fazem, quando todas as bandas presentes têm um nível incontestável. Os Devil in Me trouxeram a Cacilhas um pouco de todo o seu repertório, trazendo desde o novo “The End” com “The End” e “Push, Twist & Turn”, passando pelo anterior “Brothers in Arms” através das músicas “Brothers in Arms” – que fechou o alinhamento – “Only God”, “Live Fast Die Young” e “From Dusk Till Dawn” e revisitando, ainda dos tempos de Lockdown, e presente em “Born to Lose”, “Alive”. Não foi dos concertos mais longos da banda e, por vezes atraiçoado pelo feedback exagerado que o Revolver pontualmente presenteia – algo que será ainda mais problemático em For the Glory, mas a seu tempo. Muita jovialidade esta banda arrasta, pelo que é sempre bom que a mesma tenha contacto com este tipo de eventos, com este tipo de finalidade.
Aos For the Glory coube então a honra de encerrar a noite. A banda trouxe a Cacilhas um alinhamento baseado especialmente no novo “Some Kids Have No Face”. “Some Kids Have No Face”, “Armor of Steel”, “All the Same”, “Where’s Justice” – com dedicatória especial aquilo que não tem lugar numa cena como a punk hardcore -, e “Behind My Back”, foram as músicas do novo disco que o repleto e devoto Revolver Bar pode cantar e dançar, no espaço que conseguisse arranjar para tal. A “Survival of the Fittest” a banda foi ainda buscar a música que o entitula “Survival of the Fittest”, “All Alone” e “Fail Me”, indo ainda buscar a velhinha “Won’t Crawl On My Knees” ao bau de “Drown in Blood”. Visitando ainda os compêndios mais cruciais do hardcore, os For the Glory surpreenderam tocando “Things We Say” dos Gorilla Biscuits. Afinal, numa noite como esta, uma cover só poderia mesmo vir de uma banda com um animal no nome. Pena que, a espaços, o já referido feedback, eco, o que se lhe queira chamar, do Revolver Bar tenha condicionado um pouco a percepção do som da banda, confundido demasiado os instrumentos.
Uma noite em que, público, bandas, organização mas, acima de tudo, associações de animais ganharam e só têm de ficar felizes pela repercussão que teve. Muito público a mostrar que, como se foi dizendo ao longo da noite, não são necessárias bandas estrangeiras super cruciais para encher salas em Portugal. São, pelo menos, necessárias boas ideias, boas organizações. Um noite que fez todo o sentido pois, afinal, nunca estivémos tão entregues à bicharada como agora. Há, pelo menos, que os estimar. Aos animais.
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